Reportagens sobre o CD LUAS DO GONZAGA

05/07/2013 11:59

JORNAL O GLOBO 17/12/2012

Luiz Gonzaga além do forró

Gereba lança CD reunindo choros e valsas que o sanfoneiro compôs nos anos 1940, com letras inéditas de artistas como Gilberto Gil e Zeca Baleiro

LEONARDO LICHOTE

RIO - Era a madrugada de 12 para 13 de dezembro de 1985 quando o compositor Gereba chegava ao sítio de Luiz Gonzaga em Exu para comemorar o aniversário de 73 anos do Rei do Baião, ao lado de convidados como Gilberto Gil, Marinês, Dominguinhos e Gonzaguinha. Nos cinco dias que passou ali, ele teve a oportunidade de conversar longamente com o anfitrião.

— Gonzaga não falava muito com as pessoas sobre estar farto de ser reconhecido apenas como um forrozeiro — conta Gereba. — Ele conversava sobre isso com poucos porque, afinal, ele era o Rei do Baião. Mas me mostrou, com muito orgulho, os discos de 78 rotações com as valsas e os choros instrumentais que gravou na década de 1940, antes de lançar “Baião”, gravada em 1949. Não pude ouvir ali, mas fiquei com aqueles rótulos na mémoria, aquelas valsas com nomes de mulheres: Lygia, Verônica... E aquilo ficou como se fosse uma missão para mim, mostrar essa outra face dele, como compositor de valsas, choros, tangos, maracatus.

Passados 27 anos, Gereba conseguiu cumprir sua missão. O artista organizou o CD “Luas do Gonzaga”, que reúne músicas desse período, com versos escritos por Gilberto Gil, Abel Silva, Zeca Baleiro, Fernando Brant, Lirinha e Capinan, entre outros. As canções, inéditas, foram gravadas por intérpretes como Fagner, Elba Ramalho, Jorge Vercillo, Ná Ozzetti, Jair Rodrigues, Flavio Venturini, Lenine e Margareth Menezes, além do próprio idealizador do projeto.

— Minha ideia era mostrar essa diversidade, o caleidoscópio que há em Gonzaga. Ele está em todos esses artistas. Flavio Venturini, por exemplo, era a voz mineira, seresteira, para cantar “Wanda”. Uma canção, que não é sobre uma mulher dos anos 1940, mas uma mulher do carnaval baiano dos 1970 — diz Gereba, que produziu o CD ao longo de cinco anos, sem dinheiro mas “com a ajuda de todos os artistas”.

Valsa feita para Gonzaga

No CD, Gerebamostra três faixas suas, homenagens ao mestre. Uma é “Sete luas do Gonzaga”, com letra de Ronaldo Bastos (“Hoje eu tenho o amor que eu sonhei para mim/ E o luar de Seu Luiz pra sempre no meu pensamento”). Com Capinan, fez “Galope além do mar” (“O povo republicano/ Me elegeu Rei do Baião”).

— Ronaldo ouviu “Marieta” (que ganhou letra de Fernando Brant) e me passou um e-mail, pedindo uma valsa do Gonzaga para pôr versos — conta Gereba. — Falei que não tinha mais, mas que havia uma valsa minha feita para Gonzaga. Ele fez a letra e sugeriu Jussara Silveira para cantar, ficou lindo. Capinan, que foi muito amigo de Gonzaga e escreveu o roteiro do histórico show dele no Tereza Raquel, me deu uma letra para eu colocar música.

A terceira faixa de Gereba é a “Suíte Lua Gonzaga”, feita sobre canções do homenageado:

— Toquei essa suíte muitas vezes para ele, que adorava. Muitos de seus clássicos ele fez no violão, como “Assum preto”.

A amizade de Gereba e Gonzagão se fortaleceu quando, em 1974, o jovem artista produziu para o mestre seu primeiro show no palco nobre do Teatro Castro Alves, em Salvador (“Na época, ele tocava apenas na periferia da cidade”). Nos cinco dias de festa de 1985, Gereba o chamou para tocar no carnaval baiano de 1986, pelo projeto Carnaforró, que levava pela primeira vez um trio elétrico para a orla:

— Gonzaga resistiu, mas aceitou ir para tocar umas musiquinhas só. Mas, depois que começou, não quis mais voltar ao camarim — conta Gereba, que chama atenção para a importância histórica da apresentação. — Inauguramos ali o circuito Barra-Ondina, hoje tradicional no carnaval baiano.

Gil escreveu letra em 1985

Algumas letras inéditas para as músicas de Gonzagão têm histórias curiosas. “Mara” foi entregue para que Zeca Baleiro escrevesse a letra sem que Gereba soubesse que o nome da mulher do maranhense era o mesmo escolhido por Gonzaga para canção. E os versos do choro “Treze de dezembro” (data do aniversário do sanfoneiro) foram feitos por Gilberto Gil naquele dia em que Gereba chegou ao sítio em Exu:

— Tenho a fita de Gil cantando a música lá, mostrando-a pela primeira vez — conta o idealizador do disco. — No início, Gil faz uma referência ao momento em que chegamos no sítio, eu, Carlos Pitta (que assina a letra de “Uma serenata”, registrada no CD) e nossas namoradas. Ele canta: “Bem que essa noite eu vi gente chegando/ Eu vi sapo cantando e ao longe ouvi o ronco alegre do trovão”.


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